Vamos estabelecer um fato. Eu tenho um fascínio quase antropológico por essa explosão recente de jogos “Simulator”. Existe uma estranha poesia em como nós, como cultura, decidimos transformar as vocações mais exaustivas e mundanas da existência humana, dirigir caminhões por doze horas, lavar a sujeira de pátios com uma mangueira, operar uma caixa registradora de supermercado, em formas de lazer digital. É um fenômeno que diz muito sobre nós.
E, claro, dentro desse universo, existe o subgênero mais… picante. O simulador de atividades ilícitas. O apelo aqui é outro. Não é sobre a monotonia relaxante do trabalho, mas sobre a fantasia de poder de ser um fora-da-lei capitalista. É o sonho de ser um Walter White, mas sem o câncer terminal e o cartel furioso.
É exatamente aqui que entra WEED SHOP SIMULATOR.
Mas atenção: eu não estou falando daquele jogo mais antigo, o Weed Shop 3, que já é uma entidade conhecida por sua excentricidade. Não. Eu estou falando do novato, o WEED SHOP SIMULATOR (assim mesmo, em maiúsculas), da desenvolvedora Dragon Path, que chegou ao Acesso Antecipado em meados de 2025.
Este é um jogo que se apresenta com a ambição de ser um simulador de império. A própria premissa sugere profundidade: construir um negócio de cannabis da semente à venda, criar híbridos, dominar o mercado. Foi essa premissa que me puxou. Eu entrei esperando um desafio de gerenciamento, uma simulação complexa disfarçada de uma piada.
O que eu encontrei, no entanto, não foi um império. Foi um lote vago.
Onde está o roteirista?
A estrutura de uma análise como esta exige que eu fale sobre a “História”. E, francamente, eu procurei. Eu juro que procurei. Um jogo que se propõe a simular um “império” deveria, por definição, ter algum tipo de progressão narrativa. Talvez um mentor para lhe dar as boas-vindas? Um rival tentando tomar seu ponto? Missões para fazer amizade com figuras locais?

A minha experiência foi outra. WEED SHOP SIMULATOR (2025) não tem uma história. Ele não tem narrativa, não tem personagens com nomes, não tem missões guiadas por um roteiro. Ele confunde um premisse, a ideia de que você tem uma loja, com uma história.
Você é jogado em um mapa pequeno e desolado. Há uma loja. Você entra. É isso. Não há um “olá”, não há um objetivo. Os “influenciadores” não existem. Os “rivais” não aparecem. A única “aventura selvagem” que eu encontrei foi tentar descobrir por que a física do jogo fazia um bong que eu coloquei na prateleira voar em direção à parede sem motivo aparente.
A história deste jogo é um palco maravilhosamente montado para uma peça que nunca começa, onde os atores nunca aparecem. É um vácuo narrativo.
O loop infinito da colheita
Vamos ao que eu fiz, o gameplay. A estrutura é, em sua essência, dolorosamente simples. Você tem a loja no nível da rua e um porão.
No porão, eu clicava para colocar um vaso. Clicava para colocar terra. Clicava para plantar uma semente. Clicava para regar. Então, eu esperava. Um cronômetro aparecia sobre a planta. Quando ele zerava, eu clicava para colher. Na loja, eu clicava em uma mesa para processar a colheita. Clicava de novo para colocar o produto final em um pote. Clicava no pote para pegá-lo. Clicava na prateleira para exibi-lo.
Eventualmente, um cliente entrava. Ele é, na prática, um manequim com uma animação de caminhada. Ele parava em frente a um produto. Eu andava até ele e clicava. O dinheiro magicamente aparecia na minha conta. O cliente desaparecia. E então, eu repetia. Eu repeti isso. De novo. E de novo.

A questão aqui não é o que eu fazia, mas como era a sensação de fazer. E a sensação é de trabalho. Não o trabalho recompensador de um Stardew Valley ou Animal Crossing, onde seu esforço resulta em uma comunidade melhorada ou em relacionamentos mais profundos. Não. Este é o trabalho alienante de um jogo clicker de celular, mas disfarçado de um simulador 3D em primeira pessoa.
O loop é rápido, raso e fundamentalmente desinteressante. Em outros jogos do gênero, o grind (o esforço repetitivo) leva a algo: automação, expansão significativa, novas mecânicas. Aqui, o grind é a própria recompensa. Eu cultivava para ganhar dinheiro, para comprar mais vasos, para cultivar mais e ganhar mais dinheiro. É um ciclo fechado de tédio. A ideia de “construir um império” se desfaz rapidamente. Eu não sentia que estava construindo um império; eu sentia que estava preso em um estágio de tutorial que nunca, jamais terminava.
Os golfinhos que nunca vi
É na seção de “Mecânicas” que a autópsia realmente começa. É aqui que eu peguei o bisturi e fui dissecar o que, de fato, existe para fazer no jogo.
Primeiro, a mecânica central: o cultivo. Eu fui procurar a tal “Ciência do Cultivo”. Eu queria mergulhar no cruzamento avançado, criar híbridos raros e poderosos. Onde estava isso? A “ciência” é inexistente. Não há sistema de genética. Não há “cruzamento”. Eu comprava uma semente chamada “Clássica” ou uma semente chamada “Rara” e a cultivava. A diferença era apenas o preço de venda. É uma mecânica de “arrastar e soltar” com zero profundidade.
Segundo, o gerenciamento da loja. Eu tentei “criar produtos lendários”, enrolar baseados personalizados, produzir concentrados. A realidade: O “crafting” é um único clique em uma mesa que magicamente transforma um item em outro. Não há minigame, não há escolha. E a “equipe dos sonhos”? Eu joguei por horas. Eu procurei o botão de “contratar”. Não há mecânica de contratação. Não há IA de funcionário. A loja é você. Você e o vazio.

Terceiro, o “Caos”. Eu esperei pela competição. Eu queria “enganar rivais” e “proteger meu território”. Eu deixei minha loja aberta, vulnerável. Ninguém veio. Não há rivais. Não há competição. Não há ameaça. O “território” é apenas a sua loja silenciosa e bege.
E isso me leva ao símbolo final de toda essa tragédia. Havia uma lenda, um boato que circulava sobre este jogo, algo tão bizarro que me fez querer investigar: a ideia de que se poderia “andar de golfinhos”. É uma imagem tão absurda, tão específica, que tinha que ser verdade, certo? Talvez fosse um easter egg. Pois bem, eu procurei. Eu fui até a área de praia no limite do mapa. Eu olhei para a água. Não há golfinhos.
É a metáfora perfeita para WEED SHOP SIMULATOR. Uma ideia extravagante, divertida e caótica, usada para mascarar um vácuo absoluto de conteúdo.
A estética do Acesso Antecipado
Visualmente, o jogo é feito no motor Unity, e ele parece exatamente como você imagina um jogo “Unity” genérico. Ele tem aquela qualidade “janky”, aquela estética de asset flip, onde tudo parece ter sido comprado de uma loja de modelos 3D e jogado em um mapa sem nenhuma direção de arte coesa.
Os clientes são manequins de loja de departamento que deslizam pelo chão. As plantas parecem ser feitas de plástico rígido. As animações são robóticas. A física, quando existe, é um desastre cômico, com itens flutuando ou sendo arremessados pela sala sem motivo. Não há, em absoluto, a tal “cultura cannabis profunda” que a premissa sugere. Há apenas uma sala bege com uma folha verde pintada na parede.
Mas se o visual é deprimente, o áudio… o áudio é uma forma de tortura.
A música é uma única faixa de hip-hop lo-fi genérico, tocando em um loop eterno de talvez dois minutos. Eu desliguei a música do jogo em menos de cinco minutos e coloquei minha própria playlist.
Mas os efeitos sonoros são o verdadeiro vilão. Em qualquer jogo de simulação de loja, o som mais importante, e mais irritante, é o da campainha da porta. Aqui, é um DING agudo, alto e incessante. E como o loop de gameplay é rápido, os clientes entram e saem constantemente. O resultado é DING. DING. DING. Um som que perfura seu cérebro. É o oposto exato da vibe “relaxante” que o jogo tenta vender.
Um trator numa pista de Fórmula 1
Para esta análise, eu usei uma máquina mais do que capaz: um processador Ryzen 7 5700X, uma placa de vídeo RTX 4060 e 32 GB de memória RAM.
Vamos ser claros: esta é uma configuração excelente. É um PC que roda Cyberpunk 2077 com ray tracing e DLSS ativados sem suar. É um PC que lida com Alan Wake 2. É um absurdo esperar qualquer coisa menos que um desempenho perfeito de um jogo com gráficos tão simplistas quanto este.
E, no entanto, WEED SHOP SIMULATOR consegue o impossível. Ele roda mal.

O jogo “gagueja” constantemente. Ele sofre de stuttering e pequenos congelamentos. Não por causa de gráficos complexos, mas por causa de código ruim. A otimização é inexistente. Eu vi meu contador de quadros por segundo despencar, em uma loja quase vazia, simplesmente porque dois clientes tentaram entrar pela porta ao mesmo tempo.
Minha RTX 4060 não estava sendo usada; ela estava sendo insultada. Meu Ryzen 7 estava sendo subutilizado e, ao mesmo tempo, sobrecarregado por algum loop de IA mal escrito que rodava em segundo plano.
O desempenho deste jogo é a prova final de que ele não está apenas “incompleto” no sentido de conteúdo. Ele está fundamentalmente quebrado na sua fundação técnica. É um produto lançado em Acesso Antecipado que se parece, e se comporta, como um protótipo pré-alfa. Houve momentos em que o jogo travou completamente, me forçando a reiniciar o PC. O medo de que um desses crashes corrompesse meu save e me forçasse a recomeçar aquele loop tedioso do zero era a única fonte real de tensão no jogo.
O Império de Ar
No final das contas, o que é WEED SHOP SIMULATOR?
O “império” que este jogo supostamente oferece é feito de ar. O trono está vazio.
WEED SHOP SIMULATOR (2025) não é um jogo. É um placeholder. É um conjunto de ideias e conceitos, muitos deles aparentemente copiados de seus concorrentes, grampeados em um arquivo de projeto vazio.
É o exemplo perfeito da cultura do Acesso Antecipado em seu estado mais cínico: pague agora pela ideia de um jogo que talvez (mas muito provavelmente não) exista um dia.
O maior sentimento que este jogo evoca em mim não é raiva, nem frustração. É uma melancolia profunda. É a sensação de tédio existencial, o ennui de clicar em plantas falsas em uma sala bege, enquanto um ding incessante de campainha perfura meu crânio.
Não é sobre o dinheiro que eu gastei. É sobre o tempo que eu desperdicei. E no final, depois de horas vasculhando este mundo digital desolado, o maior mistério permanece. Não é como construir um império do cannabis.
É onde, diabos, eles esconderam os golfinhos.
NOTA
CONSIDERAÇÕES
WEED SHOP SIMULATOR (2025) não é um jogo; é uma fachada. É um produto em Acesso Antecipado que falha em entregar o básico: não há história , as mecânicas complexas prometidas são totalmente ausentes , e o gameplay se resume a um clicker raso e repetitivo. Pior que isso, é um desastre técnico, apresentando um desempenho inexplicavelmente ruim mesmo no hardware potente que utilizei. É o exemplo perfeito de uma promessa vazia vendida como um jogo.
