A primeira coisa que me atingiu em Rockbeasts não foi a música, mas o cheiro: cerveja barata, fumaça e o desespero que perfuma todo bar de porão onde sonhos morrem. Em um instante, eu não estava mais jogando, mas sim dentro de uma cápsula do tempo de 1993, um diorama interativo da era grunge, da MTV e de um capitalismo que faria Kurt Cobain parecer um otimista.
A premissa deste RPG de gerenciamento é simples: eu sou o empresário. Minha tarefa é levar uma banda de desajustados ao estrelato. O problema é que, no universo do rock alternativo dos anos 90, a figura do “empresário” é o inimigo. Eu não sou o herói dessa história. Eu sou o terno barato, o contrato com letras miúdas, a força que vai testar cada pingo de integridade que esses garotos acham que têm.
A Balada dos Desajustados
Em Buxville, uma cidade feita para ser esquecida, conheci a banda: um barril de pólvora. Paz, a guitarrista idealista; Vernon, o vocalista narcisista; Keith, o baterista autodestrutivo; e Carlton, o baixista endividado. A narrativa, emoldurada por uma entrevista futura com o lendário Iggy Pup (dublado pelo próprio Iggy Pop), deixa claro que a história já aconteceu; estamos apenas revivendo os destroços. A escolha de animais antropomórficos é genial, usando arquétipos para que o roteiro possa se dedicar a desmontá-los, peça por peça.
Ensaiando a Anarquia
Meu dia a dia é um exercício de controle de danos. O tempo é dividido em quatro blocos diários, e cada ação consome um. A dança constante é entre quatro medidores: Saúde, Humor, Hype e Grana. A genialidade está na interdependência deles. Aumentar o Hype com uma entrevista pode custar um ensaio e derrubar o Humor. Pagar por equipamentos novos pode significar um show mal pago que arrisca a Saúde. Não há jogada perfeita, apenas a escolha de qual incêndio apagar primeiro.
A Dissonância do Controle
A interação se dá por três pilares: diálogo, onde as escolhas realmente importam e podem minar seu progresso; a preparação estratégica dos shows, onde monto a setlist e atribuo destaques para otimizar a performance; e o show em si, um jogo de ritmo simples que serve como reflexo das minhas decisões de gerenciamento, não da minha habilidade com os botões.
Distorção na MTV
Sim, o estilo de arte lembra BoJack Horseman, mas a inspiração mais profunda vem das animações cínicas da MTV dos anos 90, como Daria. Onde Rockbeasts realmente forja sua identidade, porém, é no som. A trilha sonora original é espetacular, capturando a energia crua do rock alternativo da época. A dublagem é de altíssimo nível, e ter Iggy Pop como narrador não é um truque, é um selo de autenticidade.
Suave Como Veludo, Sujo Como Grunge
Joguei em um PC com um Ryzen 7 5700x, RTX 4060 e 32 GB de RAM. A experiência foi impecável. Com essa configuração, o jogo rodou perfeitamente, sem engasgos ou bugs. A build de preview já se mostra incrivelmente polida, um sinal de que a estabilidade técnica é uma fundação sólida para a experiência.
O Silêncio Após o Feedback
Ao final da sessão, o barulho dos amplificadores deu lugar a um silêncio pensativo. O jogo tem pedigree, ambição e talento. A escrita é afiada, as mecânicas são inteligentes e a trilha sonora é uma obra-prima. Mas ele caminha sob a sombra de suas influências.
A questão que o jogo me lança, “você vai ajudar sua banda a se tornarem rebeldes ou vendidos?”, é a mesma que lanço para o próprio jogo. Rockbeasts tem a alma de um rebelde, mas terá a coragem de ser mais que um cover bem executado? A prévia mostrou uma banda de garagem com som para lotar estádios. Resta saber se, no show principal, eles terão força para tocar uma música que seja só deles.
